Com estreia gratuita, o espetáculo do Coletivo Trama de Gato mobiliza questões sociais como o racismo e a representação de pessoas negras na mídia
Como representar um corpo subalternizado? Como derrubar as paredes das nossas inconsistências enquanto sociedade? São questões como estas que movem a realização do espetáculo Gato Preto, do Coletivo Trama de Gato, em estreia gratuita no dia 21 de agosto (quinta-feira) no Hub Cultural Porto Dragão. A partir das 19h30, o público é convidado a enveredar por uma montagem cênica vertiginosa que une literatura, música e dramaturgia para refletir sobre as dimensões psíquicas, políticas e sociais da vida de um assassino.
Baseado em um conto homônimo do escritor estadunidense Edgar Allan Poe, o espetáculo conta a história de um homem cuja vida é tomada pelo alcoolismo e pela violência. Quando em estado maníaco, o personagem, inicialmente um grande aficionado por animais, acaba por enredar-se numa trama vertiginosa com seu próprio gato, terminando por cegá-lo e enforcá-lo. Como se acompanhasse um programa de televisão, o público assiste então ao processo de degeneração psíquica dessa figura, condenada ela mesmo à morte no fim.
A história também tem como inspiração a canção Strange Fruit, da cantora Billie Holiday, considerada um hino de protesto contra o racismo nos Estados Unidos. Ao evocar imagens perturbadoras de corpos pendurados em árvores, a música escancara a violência contra pessoas negras, especialmente no sul do país. A partir da relação dessas referências culturais, o coletivo atualiza os signos que compõem essas narrativas de horror para o contexto brasileiro e reflete sobre a espetacularização do corpo negro na mídia.
Música e montagem
O espetáculo solo é protagonizado por Zéis, músico e ator que também assina a direção musical e a trilha original. A atmosfera da encenação é composta por referências que vão do rock grunge ao jazz e blues, passando ainda pela música brasileira experimental. A miscelânea proposta pelo artista parte de sua pesquisa sobre a dimensão dramatúrgica da música e da relação que as texturas musicais fazem com outros elementos que compõem a cena.
“É pensar que a música pode ter, dentro do ambiente do teatro, uma dramaturgia própria que também dialoga com as outras dramaturgias da luz, do texto, da encenação. Então, a música aparece em alguns momentos como números musicais mesmo, mas às vezes ela aparece como ruído, uma composição sonora plástica”, define o artista.
Para o coletivo, são essas escolhas estéticas e mutualidades em cena que provocam os questionamentos propostos pelo espetáculo, ativando suas dimensões sociais e políticas. Montado como um programa de auditório, o espetáculo mobiliza o público a refletir sobre as camadas da representação de corpos dissidentes pela indústria cultural.
“O que buscamos é horizontalizar esses enunciadores do que se costuma chamar de encenação, seja a musicalidade, o figurino, a cenografia, a luz, a própria atuação, a coreografia, a gestualidade e o texto. Equalizar isso e fazer esses pontos de enunciação de um espetáculo confabularem entre si, até se contradizerem. A gente está tensionando a todo momento esses clichês midiáticos, para investigar quais são as potencialidades e as contradições disso. É um jogo aberto” explica Diego Landin, responsável pela encenação do espetáculo.
O projeto foi aprovado na Lei Paulo Gustavo, contemplado no Edital para as Artes 2023, da Secretaria Municipal da Cultura de Fortaleza, e no 13º Edital Ceará das Artes, da Secretaria da Cultura do Ceará. Conta, ainda, com apoio do Hub Cultural Porto Dragão, espaço da Rede Pública de Equipamentos Culturais do Ceará.
Sobre o Coletivo Trama de Gato
O coletivo intercultural e multilinguagem Trama de Gato, em atividade há seis anos, reúne artistas e pesquisadores de origens, bairros, etnias e gêneros distintos entre Fortaleza e Caucaia. O coletivo busca colocar em xeque, de forma crítica, pedagógica e alegórica, as relações entre identidade e diferença, corpo e subjetividade, raça e gênero, sexualidade e classe, através de ações interdisciplinares entre o digital e o “real”.
Ficha técnica
encenação | Diego Landin
atuação | Zéis
direção musical & trilha original | Zéis
produção musical | O Pássaro
pesquisa para a cena | Fran Bernardino
textos | O Coletivo
tradução de “The black cat” | Washington Menezes
cenografia | Kazane & Diego Landin
design & operação de luz | Ciel Carvalho
design & mixagem de som | Victor Oliveira
figurino | Isac Bento
costura | Tata Ribeiro
cenotécnica & contrarregragem | Matheus Bizerra & Macla
fotos | Camila de Almeida
projeto gráfico | ERRATICA design
assessoria de imprensa | Thayná Facó
produção | O Coletivo
Serviço
Espetáculo Gato Preto
do Coletivo Trama de Gato
Data: 21 de agosto de 2025 (quinta-feira)
Horário: 19h30
Local: Hub Cultural Porto Dragão (Rua Bóris, 90c, Centro)
Gratuito. 90 min. 16 anos.
Com acessibilidade em Libras.
Mais informações em @tramadegatocoletivo